Na sequência do post “falsa segurança”, vou tentar dar uma pincelada sobre este tema – provavelmente o mais complicado pela nossa ignorância científica – e como nos podemos precaver, se é que podemos. Mas antes de mais, o que é o cancro? Uma célula cancerosa tem duas características importantes e diferentes das células normais:
- Multiplicam-se anormalmente, isto é, dividem-se e crescem de forma não controlada e com duas particularidades terríveis:
- não respeitam os limites dos tecidos vizinhos, invadindo-os
- metastizam, ou seja, libertam-se do tumor inicial e via corrente sanguínea invadem tecidos à distancia
- Não se diferenciam em células progenitoras, ou seja, não são exactamente iguais às células que lhes dão origem, sendo tanto mais agressivas quanto menos se parecem com elas (indiferenciadas)
A abordageml a esta doença assustadora deve ser efectuada sempre que possível pela prevenção, incidindo sobre os estilos de vida e sobre os meios auxiliares de diagnóstico precoce. Em regra, neste caso, os tumores já estão razoavelmente avançados ou com metástases. Comecemos pois pelos estilos de vida. O que me parece mais óbvio reside na nossa relação com o Sol, pois fruto da heliofobia actual pouco ou nada nos expomos ao Sol, tendo como consequência imediata uma insuficiência acentuada em vitamina D. A minha experiencia clínica, dado o facto de prescrever desde há dois anos a análise ao 25-OH-colecalciferol (vitamina D não activada) a todos os meus pacientes permite-me inferir que a maioria dos portugueses é insuficiente em vitamina D. Ora, para além da actuação desta vitamina sobre o metabolismo fosfo-cálcico, a vitamina D tem uma acção importantíssima sobre a multiplicação e a diferenciação celulares – exactamente as características das células cancerosas – promovendo uma multiplicação e diferenciação normais. Como tal parece-me de vital importância a exposição solar, ou em alternativa, a suplementação oral com vitamina D não activada. Mais, sabemos que níveis suficientemente elevados desta vitamina reduzem a zero o risco de cancro da mama. O exercício físico é fundamental para termos todos os nossos mecanismos imunes activados e desta forma podermos eliminar as células cancerosas à medida que elas vão aparecendo. E desenganem-se, pois aparecem mesmo durante a nossa vida, resumindo-se tudo ao equilíbrio entre a sua agressividade e o seu controlo pela imunidade. Parte importante do nosso estilo de vida reside na alimentação, a qual infelizmente é tudo menos saudável! Ingerimos pouca fruta e legumes, logo poucos antioxidantes, pelo que expomos as nossas células à agressão pelos radicais livres de oxigénio. Vivemos num ambiente poluído por pesticidas e derivados dos plásticos que nos alteram os eixos hormonais, e sobre o qual pouco ou nada podemos fazer, excepto no caso do tabagismo o qual sabemos ser responsável pelo cancro do pulmão. Um alerta para os ex-fumadores: há um aumento do aparecimento deste cancro ao fim de sete anos de cessação tabágica, pelo que estejam alerta! Mas podemos ter boas escolhas alimentares sabendo que os óleos vegetais (particularmente quando expostos ao calor da fritura) e as margarinas são capazes de alterar as nossas membranas celulares abrindo caminho à lesão cancerosa. E que dizer do açúcar e de todos os alimentos – hidratos de carbono – passíveis de se transformar em glicose? O que é que as células cancerosas mais necessitam para se poder multiplicar da forma catastrófica tão peculiar? De muito combustível, ou seja, glicose. Se lhes limitarmos a fonte de glicose, limitamos o seu processo de crescimento da mesma forma que um exército que invada rapidamente um país extenso fica com a sua capacidade bélica comprometida pela falta de reabastecimento. Simples, e infelizmente muito ignorado! Desta forma se limitarmos a ingestão de HC á fruta e aos legumes ingerimos a quantidade mínima para a actividade celular normal, limitando o abastecimento à actividade celular anormal. E se fizermos uma suplementação com antioxidantes – ácido alfalipoico, vitamina C, E, A, Selénio, resveratrol, e outros fitoquímicos, bem como com ómega-3, limitamos muito a agressão oxidativa. A harmonização hormonal também fecha uma porta ao surgimento de células cancerosas, pelo que o seu equilíbrio é vital.
Vejamos o que se passa com os meios auxiliares de diagnóstico. Falemos dos rastreios, pois são esses que mais nos podem valer. Em relação ao cancro da mama e ginecológico podemos fazer a determinação dos metabolitos dos estrogénios na urina e ter antecipadamente uma visão sobre o equilíbrio dos factores pró e anti-cancerígenos. O rastreio do cancro do colo e a ecografia endovaginal (determinação da espessura do endométrio) podem ser auxiliares valiosos, bem como a ecografia mamária, mas no caso específico da mamografia teremos de ponderar muito bem este exame. A mamografia só por si, dada a dose de radiação – pode iniciar um cancro da mama – e mais uma vez dá uma falsa segurança pois só são visualizados tumores com tamanho relevante. Ou seja, há falso negativos que é preciso considerar e ponderar em relação às atitudes posteriores. A termografia, método em que se fotografa os tecidos através de uma câmara de infra-vermelhos, pode dar um diagnóstico supra precoce e é inócua mas tem alguns contra. É necessária uma divisão com ambiente térmico controlado, uma câmara muito sensível, e uma leitura efectuada por técnico muito experiente. O que conheço em Portugal não preenche estes requisitos…! Mas estamos inequivocamente perante um exame preciso e inócuo. Pode ser que com o tempo ele seja integrado nos rastreios. Em relação ao cancro do cólon o exame mais fácil é a pesquisa de sangue oculto nas fezes, anualmente, e no caso de positividade a colonoscopia. Quanto ao cancro do pulmão, infelizmente quando se detecta já é tarde (a suplementação diária de metformina parece ter acção preventiva). Outro cancro comum é o da próstata, o qual se pode testar através de ecografia, ratio de PSA livre e total, mas sobretudo através da biopsia. Mais uma vez o equilíbrio hormonal (atenção à progesterona), não esquecendo que a vitamina D é uma hormona, é fundamental. O cancro de pele é facilmente detectável pela observação clínica atenta. Pouco se faz e muito haverá a fazer, mas em relação ao cancro a nossa falsa segurança é total, e devemos apostar tudo na sua prevenção. É provavelmente a patologia que menos depende dos médicos e que mais depende de estilos de vida saudável. Façamos por isso!